A Deusa Vesta e as Virgens Vestais: alguma relação com Manaus?

 


 

Os antigos ocidentais (gregos e romanos) sempre tiveram o culto às deusas, as divindades femininas eram muitas e muitas vezes as mais importantes para as cidades. O sistema religioso era politeísta e cada cidade possuía os seus deuses de proteção. E este post é em homenagem à Vesta, a deusa romana do lar, para os gregos Héstia, e as interrelações que podemos fazer no nosso mundo contemporâneo.

O sagrado feminino foi um tema que me chegou tardiamente, talvez. Quando eu pesquisava sobre as esculturas do Centro Histórico de Manaus e me deparava com a quantidade e diversidade de representações femininas que precisavam ser desvendadas. Muitas delas, referentes a deusas da antiguidade clássica greco-romana. Aqui tem um post que fala de 10 deusas romanas, bem informativo.

Quando estudamos História da Arte, especialmente as esculturas, as primeiras que vemos são esculturas representando a deusa mãe, sendo a Vênus de Willindorf a mais conhecida. Eram as deusas da fertilidade que proporcionavam a fertilidade do solo para garantir a subsistência dos grupos humanos. Sem fertilidade não há vida. Sem as deusas, não havia a vida. 

Os romanos adotaram muitos aspectos da cultura grega na arte e na religião. O panteão grego tem o seu equivalente no panteão romano. Esse é o caso da Deusa Vesta romana, considerada a deusa do lar, do fogo acolhedor do lar, do equilíbrio espiritual, da estabilidade.Sua equivalente grega é a Deusa Héstia, que faz um par de oposições com Hermes. Enquanto Hermes é o Deus que sai para os trabalhos externos, Héstia é a que fica em casa para manter o lar. 

Leonardo Boff, em sua coluna no Jornal O Tempo, escreveu vários artigos sobre o sagrado feminino. Um deles dedicado à Deusa Héstia, como o centro do lar e da terra. Boff vai apresentando as características da deusa como esse ponto de acolhida no lar, o cantinho de sentir-se bem dentro de casa. E vai falando como, com o tempo, o patriarcado vai enfraquecendo essa deusa. E as mulheres, ao saírem para o mercado de trabalho (o que fizeram bem, ele ressalta), abriram mão de grande parte dessa divindade e precisam voltar pra casa e retomar a deusa, que também significa o cuidado com os outros.

Pri Ferraz, em seu canal Diário da Bruxa, dedica um vídeo para discutir o arquétipo da Deusa Héstia. Ela também apresenta os atributos da deusa e parte para uma reflexão sobre como nós podemos identificar esse arquétipo da mulher que é o centro do lar, que abre mão das vaidades e do poder para cuidar dos outros, foi sendo desqualificado e desvalorizado ao longo do tempo até que chega ao nosso momento contemporâneo como algo menor: o trabalho doméstico é obrigação e não tem reconhecimento algum. O vídeo traz muita coisa interessante para pensar sobre a condição do feminino e do sagrado feminino. E como é importante sabermos equilibrar os atributos da deusa na nossa vida.

O canal Citaliarestauro também traz um vídeo, bem curto e informativo, sobre a deusa Vesta e suas festividades comemorativas. E o Blog Dez Mil Homens traz uma reunião de informações sobre a deusa, aspectos históricos e características das festividades. 

O templo da Deusa Vesta era cuidado por seis sacerdotisas chamadas de Virgens Vestais, que eram escolhidas ainda na infância e precisavam se dedicar por 30 anos às obrigações no templo. Entre essas obrigações estava cuidar da permanência do fogo que, caso apagasse, significaria mal presságio para a cidade de Roma.

Virgem Vestal










A Deusa Vesta era uma das mais antigas entre os antigos e o seu culto se estendeu até o início da perseguição dos deuses politeístas, promovida pelo recente império do cristianismo. No livro do historiador Fustel de Coulanges, A Cidade Antiga, ele fala sobre o fogo dentro do lar como a representação do ancestral. Que esse culto antigo foi apropriado pelo cristianismo que fez dele o fogo como representação do deus cristão.

E em Manaus eu penso ter encontrado alguma referência à Deusa Vesta. No livro Monumentos Públicos de Manaus, a partir da página 181, eu falo sobre o Grupo Escolar Nilo Peçanha, localizado na Avenida Joaquim Nabuco, e que tem uma fachada que se destaca dos demais prédios, por abrigar um conjunto de seis esculturas femininas. O prédio data da administração de Eduardo Ribeiro, foi entregue à população em 1895/1896 e tombado como patrimônio pelo Estado em 1988.

A arquitetura do Centro Histórico de Manaus desse período é caracterizada pelo ecletismo e pelo Art Nouveau, advindo de Paris, a cidade referência para a modernidade que se construía em Manaus. Por isso muitas esculturas com temática de divindades greco-romanas. 

Grupo Escola Nilo Peçanha - Avenida Joaquim Nabuco - Manaus. Foto: Alberto César.

As seis esculturas encontradas na fachada do prédio tem características particulares. Mas partindo da iconografia clássica, todas lembram muito as divindades romanas, pelas suas vestes, caimento dos panos, poses e objetos que portam. Por essas características vislumbro a hipótese de que elas estejam fazendo uma referência às Virgens Vestais. Tal hipótese precisa ser pesquisada iconográfica e historicamente. Assim como as outras representações femininas que ainda seguem ornando os prédios da capital amazonense. 

É fascinante quando aquilo que descobrimos nos livros pode também ser visto pela cidade, pelas ruas, nas fachadas dos prédios, nos detalhes que às vezes nem nos damos conta. Ler a cidade é isso! Buscar o sentido das coisas que se esconde nos detalhes.

Até a próxima!

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