A poesia na minha vida

 


“Poesia, arte que salva”. Esse tema é realmente muito pertinente e poético! A poesia sempre esteve presente na minha vida, mesmo antes dos livros chegarem. Minha avó e minha mãe cantavam enquanto trabalhavam e eu fui me acostumando a ouvir as rimas e a musicalidade das palavras. Nem minha avó nem minha mãe sabiam ler e escrever.

O primeiro poema que lembro de ter lido e que me marcou foi em uma coleção de livros de Português que passavam vendendo na rua e mamãe comprou para me ajudar na escola. Foram meus primeiros livros e, lá, no livro dedicado a fragmentos de literatura, eu li Irene no céu, do Manuel Bandeira.

 

Irene no Céu

 

Irene preta

Irene boa

Irene sempre de bom humor.

 

Imagino Irene entrando no céu:

                      - Licença, meu branco!

                      E São Pedro bonachão:

                      - Entra, Irene. Você não precisa pedir licença.

 Na época eu não entendia por que eu me emocionava com essas palavras! Mas eu sentia dor! E eu era criança! Nesse mesmo livro tinha a poetisa que me encantou profundamente: Cecília Meireles! E só bastou conhecer um poema: As meninas.

 

Arabela

abria a janela

Carolina

erguia a cortina

E Maria

olhava e sorria:

“Bom dia!”

(...)

Pronto! Foi o que bastou para mudar a minha vida. Foi aí que eu senti realmente que a poesia me salvou, porque eu queria ser essa Maria do poema, meu nome é Maria. Eu queria ser lembrada por ser querida, por sorrir e dizer “Bom dia!”, por ser gentil com as pessoas. E esse passou a ser o meu ideal de vida.

Um tempo depois, na escola, descobri que eu poderia também escrever poemas e escrevi. Na 5ª série (atual 6º ano) eu escrevi um poema com vinte estrofes, para homenagear a minha professora de Português. Foi nesse período que despertei para a literatura, que passei a conhecer esse universo fascinante dos livros.

Essa foi a fase em que eu conseguia até ganhar algum dinheiro escrevendo cartas e poemas para meus colegas da escola e vizinhos que queriam impressionar alguém. Eles me contavam um pouco sobre o que sentiam, sobre quem era a outra pessoa e eu escrevia. Achava fascinante viver, pela poesia, tantas histórias diferentes! Eu escrevia em papel de carta, com caneta perfumada e colocava em envelope que eu mesma confeccionava com papel de presente. E cobrava pelo trabalho. Ainda hoje tenho essa facilidade de escrever em versos, histórias que me contam.

A partir daí, a escola passou a ser uma aventura fantástica de conhecimento e experimentações (aliás, acho que sinto isso desde o primeiro dia em que pisei em uma sala de aula). Ainda no Ensino Fundamental eu exercitava as rimas construindo paródias com os amigos, para brincar com situações nossas do cotidiano.

Depois do Ensino Médio a poesia me salvou de novo. Sem ter mais a Escola à noite eu fui preenchendo esse vazio estudando métrica, com um livro que comprei (Manual de Redação).  Foi quando produzi os meus primeiros sonetos. E escrevia muitas histórias ouvindo músicas, aproveitando os motes das letras que iam aparecendo. Ao final de uma sequência de músicas às vezes eu tinha dez páginas escritas. Era uma diversão!

Quando entrei na Universidade, convivi com muitos artistas (desenhistas, músicos, atores, bailarinos) gente extremamente criativa: era o curso de Educação Artística. Muitos também escreviam e nós fazíamos poemas durante as aulas, coletivamente. Participei de um Varal de Poesias e expus alguns escritos pela primeira vez. Fazer poesia era tão natural!

Depois de um tempo, criei um Blog para guardar esses textos que estavam em cadernos, agendas, arquivos de computador, cartões... tudo espalhado. E continuei escrevendo, falando sobre minhas experiências, minhas emoções.

Então vieram as publicações de verdade. Em 2016, o livreto Manaus em Poesia, em que conto a história da cidade toda em versos, para diferentes leitores e que virou material didático. Em 2018, no livro Conexões Literárias, que organizei junto com um grupo de alunos da Pós-Graduação, expus alguns poemas dessa época da faculdade. Em 2019, lancei a 2ª edição do Manaus em Poesia, dessa vez revisto, ampliado e totalmente ilustrado, assumindo de vez, enquanto professora, essa linha de poesia didática.

Em 2020, em meio à pandemia da Covid-19 e à necessidade de isolamento, a poesia está me salvando de novo. Estou escrevendo de forma mais intensa! Outros poemas, para a sala de aula, para a minha diversão, para contar a história da minha família, para exercitar a palavra, para sentir que ainda existo enquanto ser sensível em meio a esse período de desumanização. Sim, a poesia salva! E nos liberta!

 

Em tempos de poesia

Leio tudo versificado

Se não tem vou inventando

Cada palavra um achado

Costurando, costurando

Da linha faço bordado



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Texto originalmente escrito para o evento "Sensações e Sabores". Encontro de formação para professores, promovido pela SEMED, realizado em julho de 2020, de forma remota. Integra o livro "Sensações e Sabores", ainda não publicado.

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